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(Especial Oscar 2013: crítica do filme “Argo”)

Aviso: A crítica contém spoilers! Só leia se você já assistiu ao filme ou se não liga de saber sobre alguns fatos importantes antes de vê-lo.

“Argo”...
Esse é o nome da nau usada por Jasão e os Argonautas para ir à Cólquida, atual Geórgia, em busca do velo de ouro.
Ou seja... Uma palavra que não tinha significado nenhum para a maioria das pessoas (a não ser para especialistas ou apreciadores da história da mitologia grega), hoje, além de simbolizar o filme mais maduro da carreira de Ben Affleck, também o consagra, enfim, como um verdadeiro e respeitado diretor de Hollywood.
Ben Affleck já havia dirigido dois longas antes, “Medo da Verdade”, 2007, que marcou a sua estréia como diretor de Hollywood, e “Atração Perigosa”, 2010. Ambos tiveram indicação ao Oscar, o primeiro na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante, para Amy Ryan, e o segundo na categoria de Melhor Ator Coadjuvante, para Jeremy Renner. Nenhum levou o prêmio.
Após dois filmes muito bons, consistentes e interessantes, mas sem nada que chamasse muita atenção da Academia, Ben Affleck dessa vez conseguiu fazer com que os holofotes se voltassem para ele, com um competentíssimo trabalho que narra uma história baseada em fatos reais, porém desconhecida, que mostra uma tensão política, ainda atual, e satiriza Hollywood, em sua “aventura” mais heróica.
Apesar de ter sido indicado à categoria de Melhor Filme dessa vez, o Oscar ainda não valorizou o trabalho de Ben Affleck por completo, deixando-o de fora da importantíssima categoria de Melhor Diretor. Já o Globo de Ouro deu muito mais valor, não só indicando como também dando o prêmio de Melhor Diretor e Melhor Filme de Drama para ele.
“Argo” se passa em 1979 e conta a história da chamada “Crise de reféns no Irã”, na qual iranianos furiosos com a recusa do governo dos Estados Unidos da América de entregar o xá Reza Pahlevi, deposto pelo aiatolá Khomeine, invadem a embaixada dos EUA no Irã, fazendo 54 pessoas de refém. Em meio ao caos, seis funcionários conseguem escapar e se refugiam na casa do embaixador canadense em Teerã, Ken Taylor.
Com todos cientes de que era apenas uma questão de tempo até eles serem encontrados e mortos, a CIA entra em cena e o seu vice-diretor assistente, Jack O’Donnell (protagonizado muito bem pelo ator Bryan Cranston), contrata o especialista em exfiltração Tony Mendez, feito pelo próprio Ben Affleck, que arquiteta um arriscado plano, no qual ele finge estar realizando um filme de ficção científica, chamado “Argo”, para tirá-los do país. Para que isso se concretize com sucesso, Tony precisa de tudo que faça o filme parecer real, portanto, ele contrata duas figuras que conhecem Hollywood como a palma de suas mãos: o produtor Lester Siegel, protagonizado por Alan Arkin (indicado ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante pelo papel), e John Chambers, feito pelo ator John Goodman.
O roteiro da produção cinematográfica foi adaptado com base nos relatos reais do livro “Master of Disguise: My Secret Life in the CIA”, escrito pelo próprio Antonio J. Mendez, e também no artigo “How the CIA Used a Fake Sci-Fi Flick to Rescue Americans From Tehran”, de Joshuah Bearmen, publicado na revista Wired.
Na CIA desde 1965, Antonio J. Mendez era o chefe da Seção de Disfarce e supervisor das operações de logística em ações de resgate, já tendo retirado quase uma centena de pessoas de situações de risco em países como Irã, Vietnã e Rússia. Quando foi chamado por Jack para cuidar do caso abordado no filme, o agente tinha 38 anos. Hoje, Tony é aposentado (desde 1990) e é um premiado artista plástico e escritor, residente de Maryland, onde mora com sua esposa e duas filhas.
O plano, que ocorreu no terceiro ano do Governo Carter (1977-1981), ficou em sigilo por muitos anos, sendo liberado e revelado na imprensa apenas no governo Clinton (1993-2001).
Dada à época em que se passa o filme, Ben Affleck usou um truque brilhante que deu um importante efeito ao filme. O diretor optou por filmar com uma película comum e depois cortou os quadros pela metade, ampliando as imagens em 200% para aumentar os grãos e dar a impressão de um filme feito em 1970. Além disso, Ben também usou os mesmo movimentos de câmera das cenas agitadas do escritório de “Todos os Homens do Presidente”, de Alan J. Pakula, um dos thrillers políticos mais representativos da época. Visivelmente inconfundível. Já as cenas externas foram baseadas no filme, também de 1976, “A Morte de um Bookmaker Chinês”, de John Cassavetes.
“Argo”, um dos melhores filmes do ano de 2012 e favorito ao Oscar 2013, acaba exagerando um pouco na dose de suspense, visto que a fuga dos seis na história real foi bem mais simples do que a mostrada nas emocionantes cenas finais do filme. Porém, no contexto do filme, isso acaba se tornando extremamente plausível e positivo, dando ao espectador uma verdadeira aula de como se transformar um fato real em um sucesso de Hollywood, afinal, se a fuga fosse mostrada como de fato aconteceu, a produção não teria o tido o mesmo impacto e visibilidade.
“Absolutamente nada daquilo aconteceu! É verdade que poderia ter havido problemas com a documentação - que era a nossa maior vulnerabilidade, mas a CIA tinha feito seu dever de casa e sabia que as autoridades iranianas de fronteira habitualmente não fazem qualquer tentativa de checar documentos (verificando a entrada e a saída). Felizmente para nós, havia poucos homens da Guarda Revolucionária. É por isso que marcaram um voo às 05h30 da manhã, porque eles não eram zelosos o suficiente para estar lá tão cedo. A verdade é que os oficiais de imigração mal olharam para a gente. Tomamos um voo para Zurique e, em seguida, fomos levados para a residência do embaixador dos EUA em Berna. Foi simples assim”, contou Mark Lijek, um dos seis que conseguiram fugir (protagonizado no filme por Christopher Denham), em entrevista à BBC.
Mark, assim como todos os outros que estiveram lá e foram protagonizados no filme, mesmo com as doses extras de suspense, ficou impressionado com o resultado do filme e diz ter se tornado um grande fã do trabalho. “Eu me diverti com o verniz dado à verdade em nome do efeito dramático.”
Quem não gostou muito do resultado final, fruto do árduo trabalho de Ben Affleck foi... Claro... O próprio governo do Irã, que planeja uma resposta ao filme. O “Argo” foi considerado islamofóbico pelo país, já que o filme faz duras críticas ao governo e costumes do país (apesar de apenas mostrar a realidade).
Os líderes políticos do Irã irão financiar um filme que conte exatamente a mesma história, porém, do ponto de vista iraniano. A produção, a princípio, irá se chamar “The General Staff” e terá como diretor o aiatolá Salmanian, um diretor pouco importante para o cinema. Os filmes iranianos mais clamados pela crítica internacional são aqueles realizados por cineastas que não compartilham do conservadorismo do governo do país, como é feito no filme “A Separação”, por exemplo.
Apesar da já esperada crítica negativa do governo iraniano, o filme de Ben Affleck (produzido também por George Clooney e Grant Heslov), mesmo com os fatos que não coincidem com a realidade (plausíveis) e os personagens inventados (para amarrar melhor a história), é uma grande produção cinematográfica que consagrou o cineasta oficialmente como um novo grande diretor de Hollywood, o que em 2003, por exemplo, era algo inimaginável, já que ele era, no mínimo, uma piada pela sua atuação no filme “Demolidor – O Homem Sem Medo”.
Ele se encontrou totalmente, já que a atuação não é o seu forte. A prova disso é que ele foi muito bem neste papel, que se trata de um agente secreto que preza pela discrição. A sua atuação discreta e que não chama nem um pouco a atenção caiu como uma luva para o papel... Já seu trabalho como diretor... Esse sim chamou a atenção.
“Argo fuck yourself...”

Arthur Ordones


(Especial Oscar 2013: crítica do filme “Django Livre”)

Aviso: A crítica contém spoilers! Só leia se você já assistiu ao filme ou se não liga de saber sobre alguns fatos importantes antes de vê-lo.

Quentin Tarantino, o grande rei dos amantes de filmes de ação com muito sangue e violência, dos fãs de diálogos inusitados, inteligentes, satíricos e pungentes, vem ascendendo há muito tempo e se superando a cada filme que realiza, seja como roteirista, diretor, ou ambos, mas, agora não tem como ter dúvidas de que ele conseguiu atingir o auge de sua carreira ao fazer um filme ainda melhor que o brilhante “Bastardos Inglórios”. O melhor e mais delicioso banho de sangue “Tarantinesco”, Django Livre, com certeza é o melhor trabalho de sua carreira (pelo menos até ele fazer seu próximo filme).
“Django Livre”, além de uma denúncia aos males da escravidão e aos escravocratas americanos, é uma grande homenagem aos westerns spaghetti, ou seja, os filmes de faroeste realizados por diretores italianos, muito populares nas décadas de 60 e 70. Esse gênero ficou conhecido como uma forma de o cinema europeu ganhar em cima dos westerns americanos, que estavam com a popularidade extremamente baixa em Hollywood na época.
O filme se passa “em algum lugar do Texas” no ano de 1858, pouco mais de dois anos antes da guerra civil americana (conhecida como Guerra da secessão, que durou de 12 de abril de 1861 a 09 de abril de 1865), e conta a fantástica história de Django (Jamie Foxx), um escravo com um passado devastador que é encontrado e “comprado” pelo caçador de recompensas King Schultz (Christoph Waltz), uma espécie de coronel Landa – seu papel em Bastardos Inglórios – mais contido e que trabalha para o lado certo.
Schultz é um antiescravagista, portanto, sua compra tem um motivo e veio junto a uma promessa. Django é o único capaz de ajudá-lo a encontrar dois assassinos, os irmãos Brittle, e, segundo a promessa, após contribuir para capturá-los, “vivos ou mortos”, ele receberá a sua alforria e ficará livre para ir atrás de sua esposa, Broomhilda Von Shaft (Kerry Washington), uma escrava rebelde que fala alemão.
Após a captura, os dois, já amigos, optam por não se separar e continuam juntos atrás de pistas sobre o paradeiro da esposa de Django, enquanto seguem em busca dos criminosos mais procurados do sul, sempre lembrando que, “quanto mais perigoso, maior a recompensa”.
A procura por Broomhilda acaba levando os dois caçadores de recompensa até Candyland, uma propriedade agrícola de um homem terrível, chamado Calvin Candie (Leonardo DiCaprio), atual dono da tão procurada esposa, cuja principal diversão é assistir a lutas “mandingo”, ou seja, seus escravos, preparados pelo treinador Ace Woody, lutando até a morte na sala de sua casa.
Sob falsos pretextos, eles conseguem se aproximar de Calvin e explorar a fazenda, porém, as mentiras acabam chamando a atenção do mordomo Stephen (Samuel L. Jackson), um repulsivo e desprezível negro que renega e explora sua raça.
Quando eles são descobertos e o cerco se fecha para os dois, o sangue começa a jorrar de verdade. O mais delicioso banho de sangue “Tarantinesco”, que já vinha desde o começo do filme, vem de forma a mostrar ao espectador o porquê este é o melhor trabalho da vida do diretor.
“Django Livre” se tornou, em apenas quatro semanas, o filme mais lucrativo do diretor americano. No primeiro mês em cartaz, o filme já havia arrecadado 130 milhões de dólares, levando “Bastardos Inglórios” para a segunda colocação, com 120,5 milhões de dólares.
Um fato neste filme que chama a atenção dos fãs do cinema de Tarantino é que o personagem principal é o primeiro do diretor a ser motivado pelo amor, diferente de todos os seus outros trabalhos, com personagens pautados pela vingança.
Outra coisa muito curiosa no filme é a aparição do grande Franco Nero, um ator italiano conhecido principalmente por seu papel no filme “Django”, de 1966. Coincidência? Não. Está mais para uma homenagem. Tarantino não quis recontar a história de “Django”, mas sim apenas reutilizar o nome do personagem e a temática sócio-cultural dos tempos do faroeste.
Claro que a piada em torno disso não podia faltar. A cena em que Jamie Foxx “ensina” Franco Nero, no papel do italiano Amerigo Vessepi, a pronunciar o nome Django, seu personagem há quase 50 anos atrás, é genial e muito bem sacada. “O D é mudo, seu caipira miserável”.
Entre as muitas piadas e sátiras inteligentíssimas feitas ao longo do filme, outra que não pode deixar de ser comentada é a “tiração de sarro” com a Klu Klux Klan, uma organização racista secreta de extrema-direita que apoia a supremacia branca e atua principalmente no sul dos Estados Unidos.
Como na época em que se passa o filme a KKK ainda não havia sido criada, a sátira foi feita com alguma espécie de grupo precursor da facção, ainda desorganizada. No entanto, a referência foi ótima, afinal, o grupo causou muitas dores de cabeça a Django no filme de 1966.
O primeiro Klan efetivo nasceu apenas após a Guerra Civil norte-americana, em 1865, no estado do Tennessee, e durou até 1870, com 550 mil membros - soldados veteranos que haviam lutado pelos estados do sul na Guerra da Secessão - que promoviam atos de violência contra os negros libertados. O segundo Klan foi criado em 1915 no estado da Geórgia e durou até 1944, com a sua doutrina misturando agora nacionalismo e xenofobia, com cerca de quatro milhões de membros que violentavam imigrantes, judeus e negros. O terceiro e último Klan nasceu em 1945 e existe até hoje, mas perdeu a sua força e conta com aproximadamente oito mil membros.
Para quem não sabe, a Klu Klux Klan é conhecida pelos capuzes brancos, usados pelos componentes da facção a fim de não serem reconhecidos posteriormente. Com isso, em seu filme, Tarantino brincou com o fato de que a mulher de um dos membros da KKK, que havia feito os buracos para os olhos nos capuzes, não havia realizado seu trabalho corretamente, deixando eles sem conseguir enxergar direito e causando uma revolta geral no grupo, na qual todos tiram seus capuzes e mostram o rosto, deixando o marido da moça furioso. Simplesmente hilário.
Estes atos de extrema coragem do diretor (que ninguém mais tem), de brincar e tirar sarro de certas coisas e pessoas, são magníficos e dão o que falar, como no filme “Bastardos Inglórios”, no qual um grupo de judeu-americanos metralha o líder nazista Adolph Hitler, que morre com o rosto todo desfigurado dentro de um cinema.
Como se pode ver, Quentin Tarantino nunca está longe das polêmicas e dessa vez não podia ser diferente. A brincadeira com a KKK foi bem vista e elogiada (provavelmente não pelos atuais integrantes do grupo, mas enfim...), porém, o uso da palavra “nigger”, insulto racista semelhante a “crioulo” em português, durante o filme inteiro, além da abordagem da escravidão em um formato western, incomodou algumas pessoas, especialmente o diretor de cinema Spike Lee, que já tem problemas com Tarantino desde o lançamento de “Jackie Brown”, uma homenagem do diretor ao gênero Blaxploitation: “não posso comentar muito porque não vou assistir ao filme. Tudo o que posso dizer é que ele é desrespeitoso aos meus ancestrais. Mas esse sou eu... Não estou falando por mais ninguém. A escravidão nos Estados Unidos não foi um western spaghetti de Sérgio Leone, mas um holocausto. Meus ancestrais foram escravos roubados da África. Eu os honrarei.”
Esta crítica do diretor Spike Lee é uma grande bobagem, afinal, o filme de Tarantino é uma importante denúncia aos males da escravidão e aos escravocratas americanos, que retrata com fidelidade as atrocidades e os absurdos que faziam com os negros naquela época. Se amenizar os atos dos donos de escravos, vai dar a impressão ao espectador que a escravidão era mais tranqüila do que todos imaginam, mas não era, era muito pior, portanto, a realidade tem que ser mostrada para as pessoas poderem entender o que aconteceu realmente. O filme quebra preconceitos, e não os alimenta.
 Em relação à palavra “nigger”, ela ajuda a contextualizar uma época e uma situação. Se ela era usada mesmo, porque não colocar no filme? O filme tem que retratar a realidade.
Outro fato, além da fidelidade aos costumes da época, que dão vida à produção cinematográfica é a sua trilha sonora. Perfeita. Essa é a palavra. Ela não poderia ser caracterizada de outra forma. A mistura das músicas típicas de faroeste, junto com hip hop e rap ficou sensacional, épica, memorável... As cenas com uma trilha não tão bem escolhida com certeza perderiam metade do efeito.
Esse é o primeiro filme de Tarantino que não foi editado por Sally Menke, que morreu misteriosamente em uma trilha de caminhadas na cidade de Los Angeles, na California, em setembro de 2010, possivelmente por causa do calor, que ultrapassava os 45 graus Celsius. A editora já tinha sido indicada duas vezes ao Oscar de Melhor Edição por seu trabalho nos filmes “Bastardos Inglórios” e “Pulp Fiction”. “Django Livre” foi editado por Fred Raskin, conhecido pelo seu trabalho na trilogia “Velozes e Furiosos”.
Além de dirigir e escrever o roteiro (original) da produção cinematográfica, Quentin Tarantino, como de costume, também aparece atuando. Entre a sua primeira aparição e sua morte não tem mais do que 10 minutos, tempo suficiente para carimbar, assinar e dar o brilho que só ele tem à sua mais nova obra de arte.
Falando em atuação, a grande estrela desse filme não foi o ator principal, mas sim o austríaco Christoph Waltz, que deu um show do começo ao fim.
Waltz ganhou o Oscar de Melhor Ator Coajuvante pelo seu papel de Coronel Hans Landa, no filme “Bastardos Inglórios”, após conseguir apagar o grande ator Brad Pitt e puxar toda a atenção para si, com uma atuação magnífica de cair o queixo. Dessa vez não foi diferente.
Jamie Foxx se saiu extremamente bem como ator principal e, com certeza, foi a escolha certa, pois nenhum faria melhor (nem mesmo Will Smith, que foi o primeiro nome para o papel, mas o recusou por estar produzindo Homens de Preto 3), mas, mesmo assim, ele acabou sendo ofuscado em alguns momentos do filme. Este é o problema de trabalhar ao lado de Waltz. Um mestre... Um grande mestre da atuação...
Leonardo DiCaprio, no papel de Calvin Candie, também deu show e mostrou como se faz o papel de um vilão terrível, apesar de não ter sido muito reconhecido pela crítica internacional.
Algo curioso sobre a participação do ator no filme talvez seja que ele conseguiu, sem querer, fazer com que pelo menos em uma cena o sangue seja real. Durante a gravação, em uma cena na qual seu personagem tem que socar a mesa, ele acerta um caco de vidro e corta a mão. Aproveitando a circunstância para dar mais vida ao filme, o ator esfrega o próprio sangue no rosto da atriz Kerry Washington, em uma cena de tortura psicológica contra ela, Schultz e Django.
Outra estrela frequentemente esquecida pelo Oscar é o grande Samuel L. Jackson, que chamou a atenção no papel do mordomo Stephen, no qual ele estava irreconhecível fisicamente, mas brilhante como de costume. Seu personagem representa o tipo de negro mais odiado por eles mesmos: traidor e explorador da própria raça. Um dos vilões mais repulsivos e asquerosos que o cinema já viu nesse contexto.
Ainda em “esquecidos pelo Oscar”, voltamos ao grande Tarantino, que, apesar de ter sido indicado na categoria de “Melhor Roteiro Original”, foi esquecido no prêmio mais importante da Academia: Melhor Direção.
Que o Oscar não vai com a cara do Tarantino, todo mundo já sabe, mas é revoltante ver as inúmeras injustiças que fazem com ele, como no Oscar de 2010, por exemplo, quando ele estava concorrendo a Melhor Diretor, Melhor Roteiro Original e Melhor Filme, com “Bastardos Inglórios”, e perdeu os três para o meia boca “Guerra ao Terror”, dirigido por Kathryn Bigelow e escrito por Mark Boal.
Esse ano, injustamente, nem indicado para o prêmio de Melhor Diretor ele foi, e, nas outras duas categorias, infelizmente, não deve ocorrer nada de diferente do que aconteceu em 2010, tornando o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante, para Christoph Waltz, a única chance do filme de levar um Oscar em uma das categorias principais. O filme ainda concorre em Melhor Fotografia e Melhor Edição de Som, somando cinco indicações.
A única vez que reconheceram o trabalho de Tarantino de verdade foi em 1995, quando ele ganhou seu único Oscar: Melhor Roteiro Original, por Pulp Fiction – Tempos de Violência.
Mas, quem sabe dessa vez essa história não muda e ele leva para casa, além de mais uma estatueta de Melhor Roteiro Original, a de Melhor Filme pela primeira vez?! Afinal, esse é o melhor trabalho do diretor... O mais delicioso banho de sangue “Tarantinesco” e que, portanto, merece ser reconhecido.

Arthur Ordones


(Especial Oscar 2013: crítica do filme “Amour”)

Aviso: A crítica contém spoilers! Só leia se você já assistiu ao filme ou se não liga de saber sobre alguns fatos importantes antes de vê-lo.

Amour... Uma obra seca, fria, angustiante e nada romântica sobre o fim da vida... Um filme carregado de dor e sofrimento, mas incapaz de provocar uma lágrima sequer...
Para ser apreciado e não sentido, “Amour” é um verdadeiro nocaute ao espectador, que sai arrasado, destruído por dentro e ainda com pitadas de confusão e tédio.
O novo trabalho do cineasta austríaco Michael Haneke, além de ser uma verdadeira obra de arte para o público “Cult”, amante do cinema europeu, também conseguiu despertar o interesse e conquistar outros tipos de espectadores, por meio de seu brilho proveniente da transparência e sinceridade dos personagens extremamente humanos e da agoniante concepção de amor do diretor. No entanto, para o público “hollywoodiano de carteirinha”, um aviso: o sofrimento excessivo (e passivo de náusea) somado à angustiante falta de ação, movimento de câmera e trilha sonora da produção cinematográfica, pode vir a se tornar uma verdadeira sessão de tortura, na qual 127 minutos se tornam, no mínimo, 500.
“Amour” conta a história de um casal de professores de música aposentados e octogenários que vivem em um apartamento em Paris. Georges e Anne têm uma vida simples e uma rotina afetuosa de um casal que parece ter passado a vida inteira juntos.
Um dia, um grave problema de saúde deixa Anne com todo o lado direito de seu corpo paralisado e inicia um processo progressivo de degradação física e mental, levando o casal da harmonia ao sofrimento em segundos, com Georges passando a dedicar-se integralmente à sua esposa.
Com Anne cada vez mais dependente e incapaz, ele contrata uma enfermeira para ajudá-lo com as necessidades básicas de sua mulher, como a de ir ao banheiro, tomar banho e se alimentar.
No auge da doença, o desgastado Georges encontra-se em uma situação de extrema periclitância e começa a repensar sobre a sua luta pela vida de sua esposa, que já desistiu e deseja morrer para cessar seu sofrimento indescritível.
Pela primeira vez na história do cinema a velhice foi retratada de forma tão dura, seca e humana. A situação é tão real que a produção deveria ter classificação indicativa para menores de 70 anos, pois deve ser um verdadeiro choque misturado a uma agonia claustrofóbica assistir tais cenas, que retratam a possibilidade de uma realidade que pode estar próxima para pessoas com essa idade para cima (muitas saíram no meio da sessão).
A atriz principal que faz o papel de Anne é a Emmanuele Riva, que, apesar de ter atuado na memorável produção cinematográfica de Alain Resnais, “Hiroshima, Mon Amour”, nunca, até então, havia conseguido ganhar uma grande visibilidade e nem se tornar extremamente famosa e aclamada no mundo do cinema, mas, agora, aos 85 anos, ela mudou esse cenário com uma atuação simplesmente impecável e digna de aplausos, tornando-se, merecidamente, a atriz com mais idade a concorrer ao Oscar pelo prêmio de Melhor Atriz.
Já o ator francês que representou Georges, Jean-Louis Trintigant, não impressionou muito e nem se destacou de forma fora do comum, apesar de, ao contrário de Emmanuelle, ter tido uma carreira sólida e plena desde cedo, com papel em mais de 130 filmes, mesmo com uma triste e trágica história de vida.
A atuação de Emmanuele ganhou os holofotes e amenizou fatos que causaram desconforto, como o excesso de frieza de Georges ao matar Anne sufocada com o travesseiro (para livrá-la de seu sofrimento). O motivo ficou claro e foi totalmente compreensível, mas a falta de sentimentos do personagem incomodou muito, afinal, ele levou a situação de forma normal e não pareceu se importar nenhum pouco com o que havia acabado de fazer, contradizendo todo o amor que parecia sentir.
Pouquíssimas cenas empolgaram e “despertaram” os espectadores, como a da demissão da enfermeira, que maltratou Anne, a do sonho de Georges, a do tapa que ele dá na cara dela (por cuspir a água) e a do sufocamento. Algumas foram desnecessárias e, para muitos, sem sentido, como as duas da pomba e a dos quadros. A maioria foi longa demais, parada e até entediante, com eles comendo, se olhando... Com um silêncio que fazia a cena durar três vezes mais do que ela realmente durava (as desnecessárias se enquadram aqui também). As cenas que sobraram, foram dolorosas e agonizantes.
O que poderia ser explorado mais a fundo, como a hora que ela passa mal a primeira vez e começa a desenvolver a doença, não foi...
Resultado final? Negativo, mas com um grande brilho de fundo que, com toda a certeza, não o deixa passar despercebido, desperta interesse e chama muita atenção, provando que é permitido sim saborear a escuridão de um cinema fúnebre e sair da sessão satisfeito.
Machucado... Mas satisfeito.

Arthur Ordones


“Legião Urbana a tudo vence”. Este era o lema de uma das melhores bandas da história da música brasileira.
A frase que está presente em todos os discos da Legião Urbana (com exceção do ultimo CD da carreira, “A Tempestade”) é uma adaptação da frase do ditador romano Julio César, “Romana Legio Omnia Vincit”, que significa: “Legionários Romanos a tudo vencem”.
A banda Legião Urbana, um verdadeiro MITO da história da música nacional, era comandada pelo maior poeta do rock brasileiro, a messiânica e imortal criatura, Renato Russo.
Renato Manfredini Júnior, além de grande músico, foi um dos melhores letristas que o Brasil já teve. Suas magníficas letras iam de críticas políticas e sociais até as mais românticas, profundas e delicadas composições já feitas.
Amor, morte, dor, sofrimento, política e sociedade eram alguns dos assuntos colocados em questão nas letras de Renato Russo.
Ao analisar suas composições, descobre-se que cada detalhe é perfeito e significativo, nada está ali por acaso e tudo nasce de questões filosóficas, literárias ou até bíblicas, aliás, muitas de suas canções intertextualizam, por meio de paráfrases, paródias e citações, outros diversos MITOS da história.
Em sua música “Monte Castelo”, com citações do soneto número 11 de Luis Vaz de Camões (“Amor é fogo que arde sem se ver”) e do capítulo 13 de Coríntios (livro da bíblia), ele homenageia os “heróis” brasileiros mortos e feridos na batalha de Monte Castelo (no norte da Itália), que ocorreu no final da segunda guerra mundial e teve participação da Força Expedicionária Brasileira.
Tudo em suas canções não são do jeito que parecem ser e tem significados que não são compreendidos se a música for levada ao pé da letra. Para ouvir “Legião” é preciso ter uma sensibilidade muito grande, é preciso estar preparado.
Em sua composição Índios, além de demonstrar sua insegurança e desespero em relação ao futuro de nosso país, coloca em sutis palavras sua tentativa de suicídio ao cortar os pulsos, dias antes de compor a música: “Eu quis o perigo e até sangrei sozinho, entenda...”. Como ele mesmo definiu a própria canção: “Essa música não fala de Índios. Ela fala de “Índios”.
Outra canção de grande impacto da banda que vale a pena ser citada é: “Metal contra as nuvens”, que além de se referir curiosamente à santa inquisição como “O Sopro do Dragão”, faz analogias com fatos medievais que são vivenciados por ele mesmo nos dias de hoje, como ter suas músicas presas pelos direitos autorais no mandato do presidente Collor.
Entre tantas outras canções sensacionais; “Pais e Filhos”, que aborda, de forma impressionante, as diversas relações e conflitos que pode haver em uma família; a música “Faroeste Caboclo”, que contém 159 versos, nos quais nenhum se repete; a sensibilíssima “Vento no Litoral”, que trata da perda de um grande amor do cantor; a instigante “Há Tempos”, que é extremamente plurissignificativa, cada um a entende de um jeito, mas, o próprio cantor, em uma entrevista, diz estar se referindo o tempo todo à Ditadura Militar (1964 – 1984); a sensacional “Tempo Perdido”; a preferida de Renato Russo, “Giz”; Eduardo e Monica; e muitas outras que marcaram época, devem ser lembradas.
Questões curiosas como estas, são encontradas em praticamente todas as letras do eterno compositor, portanto, precisaríamos de um grande livro e não uma simples matéria para abordar todas elas.
A banda Legião Urbana é eterna e o Renato Russo... É um MITO.

“Nós estamos aqui no palco... mas a verdadeira Legião Urbana... são vocês!”
(Renato Russo)

Arthur Ordones

(Especial Oscar 2013: crítica do filme “As Aventuras de Pi”)

Aviso: A crítica contém spoilers! Só leia se você já assistiu ao filme ou se não liga de saber sobre alguns fatos importantes antes de vê-lo.

Genial, grandioso e extraordinário...
Essas deveriam ser as três primeiras palavras que saem da boca de todos que terminam de assistir “As Aventuras de Pi”.
Após sentar para assistir um filme divertido, possivelmente meio infantil e “Sessão da Tarde”, por conta da história, da classificação e, principalmente, do nome dado pela tradução brasileira, que se equivocou novamente de forma grosseira, o espectador se depara com uma brilhante produção cinematográfica roteirizada, produzida e dirigida de forma cirúrgica.
A tradução brasileira do título realmente é a única coisa que incomoda, além de um primeiro ato um tanto quanto devagar. Originalmente chamado de “Life of Pi”, o Brasil foi bem infeliz ao não seguir o exemplo de Portugal, que, como esperado, chamou o filme de “A Vida de Pi”. O óbvio e certo que não fomos capazes de fazer.
É só imaginar o filme “A Vida de David Gale” com o nome: “As Aventuras de Gale”. Ficou bom? Pois é... Não faz sentido. Nesse caso, é a mesma coisa, afinal, o filme passa longe de ser uma produção voltada ao público infantil, pois apresenta uma trama repleta de conflitos espirituais que o tornam bastante complexo e profundo.
 “Life of Pi” gira em torno da história de um homem indiano de três religiões que mora no Canadá, chamado Piscine Molitor Patel, carinhosamente (após um grande esforço) chamado de “Pi”.
Em busca de uma boa história, um escritor chega à casa de Pi, que, inicialmente, não entende o motivo pelo qual ele quer saber sobre a sua vida. “Essa história vai fazer você acreditar em Deus”, foi o que um tio de Pi contou ao escritor e o motivo pelo qual ele foi até lá. Assim, começa a história de um trágico acidente narrado por Piscine, já mais velho, e mostrada toda em forma de flashbacks.
Pi e sua família moravam em Pondicherry, na Índia, onde tinham um zoológico. Após a região passar por diversos problemas político-financeiros, seus pais decidem se mudar para o Canadá, obrigando Pi a abandonar o amor de sua vida e seus poucos amigos para embarcar em um cargueiro japonês junto com todos os animais do zoológico. A idéia era vendê-los no Canadá para começar uma vida nova e cheia de oportunidades, no entanto, isso nunca acontece, pois uma grande tempestade faz o navio naufragar.
Após ser o único a conseguir sair do navio a tempo e subir em um barco salva-vidas, Pi se depara com uma zebra, um orangotango, uma hiena e um tigre de bengala, conhecido como Richard Parker. Os três primeiros não sobrevivem e Pi começa a sua experiência de sobrevivência de 227 dias dividindo seu pequeno barco com um grande tigre.
Piscine enfrenta o mar, as tempestades, a fome, a sede e um grande animal que, apesar de estar ali pronto para devorá-lo a qualquer dia e qualquer hora, em pouco tempo deixa de ser uma ameaça e torna-se a sua única motivação para viver. O filme rapidamente tira do espectador a impressão de que o enredo vai apresentar a luta do homem contra a natureza, acaba com o óbvio, e passa a mostrar o medo que o homem tem da solidão. O tigre torna-se a cura disso, pois Pi começa a enxergar que, mais perigoso que ser devorado por Richard Parker, é ser deixado sozinho no meio do oceano, o que leva o garoto a fazer de tudo pela sobrevivência do animal... Seu único amigo naquele momento.
A forma como Pi salva o tigre algumas vezes e ainda divide o alimento que consegue... Como ele tenta adestrá-lo... E o vínculo criado após muito esforço – representado na melhor cena do filme, na qual o animal deita em seu colo – são, de fato, uma lição de vida.
O final, ainda por cima, além de emocionar com a atuação rápida, porém brilhante do ator indiano Sahabzade Irrfan Ali Khan, conhecido principalmente pelo seu papel no filme “Quem Quer Ser um Milionário”, ganhador de oito Oscars, ainda deixa o espectador em uma situação reflexiva e de escolha entre duas histórias, apesar de ficar nítida qual é a verdadeira, sendo a outra apenas a que ele quer acreditar para não se lembrar da verdade. Sua mãe sendo assassinada na sua frente e depois comida por tubarões, ele matando uma pessoa - o cozinheiro, interpretado rapidamente pelo grande Gérard Depardieu - para vingar a morte da mãe, entre outras coisas...
É simplesmente genial o fato de ele ter colocado os animais representando cada uma das pessoas que estavam no barco - sendo ele o tigre – e conseguir contar a história sem uma contradição se quer, tudo para fugir da triste realidade. Ele acredita na própria história inventada de um jeito inexplicável. É lindo...
O ator que faz o Pi nos flashbacks é o desconhecido, porém surpreendentemente bom, Suraj Sharma, um indiano que venceu uma disputa com três mil concorrentes pelo papel. No filme, o ator teve a oportunidade de interpretar algumas cenas com um tigre de verdade, porém, o felino e todos os outros animais do filme foram criados em CGI (Computer Graphic Imagery), apesar de não parecer devido à perfeição indescritível da computação gráfica. Provavelmente uma das melhores já feitas na história do cinema.
O trabalho de estudo da movimentação do animal e captura de performance foi realizado pela Rhythm & Hues Studios, conhecida pela criação dos animais do filme “As Crônicas de Nárnia”. O leão de Nárnia ficou muito bom, mas dessa vez a excelência foi tão grande que é difícil acreditar que o tigre Richard Parker foi feito digitalmente.
Já o papel do escritor é de Rafe Spall, filho de Timothy Spall, que substituiu de última hora o ator Tobey McGuire, o ex- Peter Parker – de “O Homem Aranha”. O que fez ele perder o papel foi o fato de ser conhecido demais, o que descaracterizaria o efeito pretendido pelo filme ao desequilibrar o elenco.
Com seu filme indicado a 11 Oscars, o diretor taiwanês Ang Lee acertou mais uma vez ao fazer uma produção cinematográfica que marca muito seu estilo de fazer cinema. O filme tem todas as características marcantes do diretor, principalmente nessa questão da solidão, que sempre foi muito permanente em seus trabalhos. Em “Razão e Sensibilidade”, de 2005, as irmãs que perdem o pai chegam à conclusão de que um homem é a única saída para fugirem de um destino de eterna solidão. Em “Brokeback Mountain”, de 2005, um casal de cowboys gays não passava de dois seres solitários antes de se apaixonarem e encontrarem um no outro um tipo de apego em meio a tanta tristeza. Esse tipo de situação se repete também em “Desejo e Perigo”, de 2007, e até mesmo na sua adaptação da história do personagem “Hulk” e no Kung Fu “O Tigre e o Dragão”.
Em “As Aventuras de Pi”, Ang Lee mais uma vez faz questão de explicar ao espectador toda a metáfora do filme, principalmente sobre a questão do processo mental que os seres humanos utilizam para se protegerem de si mesmos e a condição humana frente a uma situação de desespero. Lee praticamente pega o espectador no colo e conta passo-a-passo o que ele quis dizer com tudo aquilo, o que às vezes se torna excessivo, porém, compreensível, visto que é nítida a convicção dele na força do significado da mensagem que ele tenta passar.
O filme foi uma adaptação do romance homônimo de Yann Martel realizada pelo roteirista David Magee. O livro foi baseado na obra “Max e os Felinos”, do brasileiro Moacyr Jaime Scliar, falecido em 2011, que chegou a considerar entrar com um processo contra Yann por plágio, mas desistiu alegando que seria difícil e trabalhoso demais. Posteriormente, o escritor canadense começou a colocar uma referência logo na primeira página do livro, dizendo que realmente se inspirou em Scliar para escrever “Life of Pi”.
É um filme sobre a vida... Sobre todos nós... Sobre as escolhas... Sobre a fé... Um filme extremamente reflexivo, que leva quem o assistiu a pensar e pensar por horas e mais horas após o seu término. Um filme que, definitivamente, não passa despercebido... Não é só mais um.

Arthur Ordones


Albuquerque, Novo México.
É na região sudoeste dos Estados Unidos que se passa a série de televisão dramática mais viciante da atualidade.
Breaking Bad conta a história de Walter White, um pouco apreciado professor de química do ensino médio que é diagnosticado com um câncer de pulmão em estado terminal, mesmo sem nunca ter fumado na vida. Com a sua esposa, Skyler, grávida e seu filho, Walter Jr., de 16 anos com paralisia cerebral, Walter se vê sem saída e resolve partir para um caminho, quem sabe, sem volta.
Realmente, não deve ser fácil ser um dos maiores gênios da química no país e ter que trabalhar dando aulas para alunos do ensino médio e, ainda por cima, ter que complementar a sua renda lavando carros em um lava-rápido. Por meio de alguns flashbacks pode-se perceber que esse infortúnio é proveniente de uma parceria que não deu certo no passado, mas isso ainda não foi devidamente esclarecido.
Apesar de todas as suas infelicidades, unir-se a um traficante de drogas e usar seus conhecimentos de química para produzir metanfetamina com o codinome “Heinsenberg” talvez não tenha sido a melhor das idéias, afinal, futuramente isso acaba não só o afastando de seus familiares e amigos, como deixando todos eles em perigo.
Para deixar a situação ainda mais calamitosa, seu cunhado, marido da irmã de sua esposa, Hank Schrader, é um dos mais competentes agentes da DEA (uma divisão antidrogas dos Estados Unidos), que começa a investigar o misterioso Heinsenberg, que já está famoso no meio por ter colocado no “mercado” a considerada melhor e mais pura metanfetamina já fabricada no mundo, chamada de “cristal azul”.
O plano de Walter White de fabricar drogas - para deixar uma grande quantidade de dinheiro para sua família quando ele morresse de câncer - foi ficando cada vez mais complicado à medida que ele foi começando a ter contato com traficantes perigosíssimos e poderosos, como o psicótico Tuco e o discreto Gus Fring, envolvendo-se em assassinatos, roubos, mentiras atrás de mentiras, entre outras coisas que caminham junto com o submundo dos narcóticos.
Enfim... Para saber o quão boa é esta série, só assistindo mesmo, pois cada capítulo que termina leva o espectador ao próximo de forma imediata, por meio de ganchos incrivelmente estratégicos e peculiaridades geniais, como os símbolos de elementos químicos da tabela periódica que aparecem no título (O Br, em destaque na palavra Breaking, é o bromo; e o Ba, em destaque na palavra Bad, é o bário) e nos créditos do começo da série, no nome de cada um dos atores do elenco. A abertura também mostra por diversas vezes a fórmula molecular da metanfetamina, C10H15N, e o número que representa a massa molecular do composto, 149.24
Outra curiosidade a respeito do nome da série é o seu significado. Breaking Bad é uma gíria da região sul e sudoeste dos Estados Unidos, onde se passa a série, que é usada para dizer que alguém se desviou do caminho correto em certo momento da vida e passou a fazer coisas erradas.
O brilhante Bryan Cranston, ator principal da série, que antes era conhecido apenas pela sua interpretação do personagem Hal, na série de comédia ‘Malcolm in the Middle’, já conquistou três ‘Primetime Emmy Awards’ de ‘Melhor Ator em Série Dramática’ consecutivos pela sua atuação no papel de Walter White. Após a visibilidade que ganhou com Breaking Bad, o ator foi chamado para integrar o elenco do filme ‘Argo’, uma grande produção cinematográfica dirigida por Ben Affleck que está concorrendo a sete estatuetas no Oscar 2013, no papel de Jack O’Donnell.
O ator Aaron Paul, que interpreta o pupilo, amigo e parceiro de negócios de Walter White, Jesse Pinkman, também surpreendeu a todos com sua atuação impecável no papel. Inicialmente, ele tinha sido contratado apenas para atuar na primeira temporada, na qual seu personagem iria morrer no último episódio, mas, devido o seu desempenho magnífico e sua química impressionante com Bryan Cranston, o ator ganhou o papel fixo na série e, ainda por cima, já foi indicado a três e faturou dois ‘Primetime Emmy Awards’ de ‘Melhor Ator Coadjuvante em Série Dramática’.
Breaking Bad estreou em 20 de janeiro de 2008 e irá terminar em 2013 com cinco temporadas. Atualmente, a série está na metade da última temporada, que foi divida em duas partes, cada uma com oito episódios, provavelmente por conta do trabalho de Bryan Cranston em ‘Argo’. As filmagens dos oito episódios finais, tão esperados pelos milhões de fãs ao redor do mundo, voltaram em novembro de 2012 e devem começar a ir ao ar nos Estados Unidos em meados de julho deste ano - no canal de televisão por assinatura norte americano, AMC.
Pois é, a angústia da espera pelo destino de Walter White está quase chegando ao fim, mas, enquanto isso, os fãs podem ficar imaginando qual será o desfecho dessa incrível história criada e produzida por Vince Gilligan, afinal, o fim do oitavo episódio da quinta temporada deixou centenas de possibilidades de destino para cada um dos personagens e inúmeras perguntas sem respostas que atormentarão a todos até o meio do ano.
Para quem nunca viu, ainda dá tempo de assistir os 54 episódios antes dos oito finais começarem, mas, quem pretende fazer isso, já fique ciente: é mais viciante que metanfetamina.

Arthur Ordones


           Quem foi que disse que amor à distância não dá certo?
            Eu tenho um que fica a 9.742 km e nós nos damos muito bem, aliás, em poucos meses finalmente iremos nos conhecer.
            Não, eu não estou falando de uma pessoa... Talvez nesse caso realmente não desse certo...
            Alguém sabe o que é amar um lugar que nunca conheceu? Ter uma grande fixação e carinho por onde nunca pisou? Passar horas e horas de dias e dias pesquisando, lendo, estudando sua história, curiosidades, costumes e, graças ao grande Google Street View, andando por suas ruas, avenidas e praças, conhecendo seus castelos, monumentos e lagos, todos rodeados por uma maravilhosa e única paisagem que, com certeza, não existe igual em nenhum outro lugar do mundo? Sim, é estranho, mas é possível...
            Depois da minha viagem à Escócia, que está marcada para o mês de outubro, um enorme e apaixonado relato descreverá, com uma grande riqueza de detalhes, cada passo que eu der dentro desse país magnífico, o MITO dos países, mas, enquanto isso, como nasceu todo este amor?
            Tudo começou com um enorme interesse pela história do passado rico e fascinante do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, um país insular e soberano formado pela união política de quatro nações constituintes: Inglaterra, País de Gales, Escócia e Irlanda do Norte. Os três primeiros países mencionados compõem a ilha da Grã-Bretanha, enquanto o quarto e último fica na parte nordeste da ilha da Irlanda, ou seja, apesar de ser uma nação integrante do Reino Unido, não faz parte da Grã-Bretanha.
            Meu antigo interesse e curiosidade por história – principalmente medieval – e geografia física e humana tomou um rumo, o que levou o estudo sobre essa região a se tornar cada vez mais profundo, transformando a simples curiosidade em uma paixão pelas histórias e paisagens de um lugar deslumbrante e pelos costumes e modo de vida de um povo fascinante...
Uma história foi puxando a outra e, quando vi, já estava no ano 6.000 a.C, lendo sobre a Britânia pré-histórica. Com isso, resolvi que iria render mais se eu seguisse a ordem dos fatos.
Da pré-história, com o enigmático Stonehenge, cheguei às primeiras expedições de Júlio César, nos anos 55 e 54 a.C, até o início da conquista romana da Britânia, em 43 d.C. Passei para a invasão dos germânicos anglo-saxões, que durou do século V até o século XI e foi chamada de Idade das Trevas, e depois para a invasão dos Normandos, em 1066, que marcou o início da Idade Média.
Após cerca de 500 anos, com o fim da era medieval, no século XV, cheguei ao início da Era Tudor, que em apenas cem anos conseguiu dar fim a uma guerra civil, criar uma nova religião e deixar a Inglaterra a um passo de se tornar uma grande potência mundial.
O término da Era Tudor me fez chegar à Era Stuart, que reinou a Inglaterra e a Escócia por 111 anos.
Depois de alcançar a Era Georgiana, que durou de 1714 a 1830, e a Era Vitoriana, terminada em 1901 e marcada pela ‘Pax Britannica’, enfim cheguei ao século XX.
O século XX trouxe consigo diversos fatos importantes na história do Reino Unido, como as duas grandes guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945) e o naufrágio do Titanic (1912). Foi neste século também, em 1952, que a atual Rainha do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte assumiu o trono, a Rainha Elizabeth II.
O Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, na atual composição, começou a ser formado em 1284, quando o Reino da Inglaterra incluiu o País de Gales em seu território. Em 1707, o Reino da Escócia também se uniu a eles politicamente, criando assim o novo Reino da Grã-Bretanha. Quase um século depois, em 1801, o Reino da Irlanda também foi incorporado, nascendo assim o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda. Em 1922, o Estado Livre Irlandês foi estabelecido como um domínio separado, mas somente em 1927, quando uma lei reincorporou ao reino seis condados irlandeses, nasceu oficialmente o atual Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, que entrou para a União Européia em 1º de janeiro de 1973.
Como acontece com quase todo mundo que se interessa por essa região, surgiu o primeiro amor: Londres.
Comprei guias de viagem e meu quarto praticamente se tornou uma miniatura da grande metrópole cosmopolita britânica, porém, ao começar a planejar e organizar minha viagem para lá, em meio às muitas leituras de relatos de viagem ao Reino Unido, visualização de inúmeras fotos das paisagens, atrações, castelos e lagos, e estudo sobre as características de cada um dos países que compõe o Reino, minha atenção foi totalmente desviada para a Escócia.
Como pode existir um lugar tão lindo e fascinante? Isso porque ainda nem o conheço pessoalmente.
Principalmente para quem mora no Brasil, é lindo ler sobre um local com um padrão e expectativa de vida tão altos, um IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) considerado muito elevado e índices tão insignificantes de corrupção, violência, pobreza, falta de moradia e fome.
Claro que não é só isso, se não a minha fixação seria... Não sei... Por qualquer país nórdico, de preferência, a Noruega (espero visitá-la em breve também), que contém o maior IDH do mundo e muitos outros índices assustadoramente perfeitos, mas é muito mais que isso...
É difícil de explicar, mas quando eu voltar da minha tão esperada viagem, vocês irão entender ao ler sobre meus passeios, não só pela capital Edimburgo (um dos principais centros financeiros da Europa) e outras grandes cidades, como Glasgow (a cidade mais populosa do país), Stirling e Inverness (nas Highlands), como também pelo vilarejo de Drumnadrochit, onde irei conhecer as ruínas do Castelo de Urquhart à beira do misteriosíssimo Lago Ness - conhecido pela lenda de seu monstro; pela maravilhosa e impecável ilha de Skye; pelo caminho de Fort William - onde fica a estátua do grande William Wallace (guerreiro escocês interpretado pelo ator Mel Gibson no filme Coração Valente) - até Mallaig, passando pelo viaduto Glenfinnan (conhecido por ser onde o trem com destino a Hogwarts passa nos filmes do Harry Potter); pelo Ben Nevis, conhecido por ser o ponto mais elevado do Reino Unido, com 1.344 metros de altura, entre tantos outros locais impressionantes.
Além dos lugares, o meu encanto também se estende pela cultura e pelos costumes escoceses, como o do belíssimo kilt, famoso saiote muito usado em eventos formais e conhecido por ser um traço marcante da cultura e identidade do país. O kilt surgiu no século XVI, no norte da Escócia, onde, na época, cada família ou clã tinha um tipo diferente de quadriculado, o que identificava os seus integrantes.
Entre tantos outros grandes símbolos da cultura escocesa, vale à pena lembrar também da música, marcada pelo som da gaita de foles, e do lindo idioma gaélico escocês, uma língua céltica falada somente por cerca de 1% da população de pouco mais de cinco milhões de habitantes (cerca de 58 mil pessoas).
A língua oficial do país é o inglês, mas, além do gaélico escocês, existe ainda a língua Scots, falada também na Irlanda do Norte, que muitas vezes não é considerada um idioma independente.
Uma curiosidade interessante é sobre a moeda utilizada no país. Apesar de a libra esterlina ser a moeda oficial de todo o Reino Unido e, portanto, ser aceita em qualquer lugar da Escócia, o país contém uma moeda própria, chamada de libra escocesa. Ela contém a mesma cotação da libra esterlina e é bem parecida visualmente, mas a diferença é que as cédulas escocesas contêm imagens de grandes símbolos do país, como o Castelo de Edimburgo.
Outra grande marca registrada da Escócia é o Festival de Edimburgo, que ocorre todos os anos nas três últimas semanas de agosto desde 1947 e é considerado o maior festival cultural e arte do mundo, com cerca de um milhão de pessoas por edição.
Por último, mas não menos importante, o grande uísque escocês. Claro que não podia faltar o famoso Scotch Whisky. A bebida escocesa por excelência é considerada como a melhor do ramo no mundo, além de ser o principal produto da economia escocesa no setor de bebidas.
Pois é... Coisas sensacionais para escrever sobre esse lindo país não faltam, mas, se preparem, pois quando eu voltar o meu relato terá mais ou menos umas dez vezes o tamanho deste.

Nos vemos em outubro, Reino da Escócia... Meu amor a 9.742 km de distância...

“Tapadh leat”

Arthur Ordones